domingo, 18 de maio de 2025

O contentamento cristão: uma reflexão em Filipenses 4:12-13

Está escrito: “12Sei o que é passar necessidade e sei o que é ter fartura. Aprendi o segredo de viver contente em toda e qualquer situação, seja bem alimentado, seja com fome, tendo muito, ou passando necessidade. 10Tudo posso naquele que me fortalece” (Filipenses 4:12-13, NVI).

 

A epístola aos Filipenses é amplamente reconhecida como uma das cartas mais pessoais de Paulo. Escrita enquanto estava preso, provavelmente em Roma, a carta reflete sua gratidão e encorajamento aos crentes de Filipos, uma igreja que ele fundou em sua segunda viagem missionária (Atos 18:12-40). No capítulo 4, Paulo encerra a carta expressando gratidão pelo sustento enviado pelos filipenses e compartilhando sua perspectiva única sobre a suficiência em Cristo, independentemente das circunstâncias.

Filipenses 4:12-13, em particular, revela o testemunho pessoal de Paulo sobre como ele aprendeu a viver contente em qualquer situação, seja na abundância ou na escassez. Essa atitude não dependia de recursos externos, mas de sua conexão com Cristo. Convido você a explorar esse texto e, juntos, aprendermos como viver contente diante de qualquer circunstância da vida.

Primeiramente, o texto nos revela dois aspectos centrais:

1. A experiência de Paulo (v.12): Paulo declara: “Sei o que é passar necessidade e sei o que é ter fartura”. Ele havia experimentado os extremos da vida, tanto a privação quanto a abundância. Ele também afirma: “Aprendi o segrego de viver contente”, o verbo grego traduzido como “aprendi” (ememathov) traz a ideia de aprendizado por meio da experiência prática. O “segredo” mencionado refere-se a uma atitude de autossuficiência em Cristo, não como negação das dificuldades, mas como uma total dependência d’Ele. 

2. A fonte de sua força (v.13): A expressão “Tudo posso naquele que me fortalece” é frequentemente mal interpretado como uma licença para superar qualquer obstáculo humano ou alcançar metas pessoais. No entanto, a declaração está diretamente ligada à capacidade de Paulo de enfrentar as circunstâncias adversas ou favoráveis com contentamento, pois sua força vinha de Cristo. A palavra “fortalece” no grego (endunamoo) significa “encher de poder”. Assim, Paulo afirma que Cristo é a fonte de sua capacidade de suportar qualquer situação.

Você pode estar se perguntando: Qual é o segredo de viver contente? Como nós, que vivemos em uma sociedade consumista, podemos aprender esse segredo? Para Paulo, o contentamento é resultado de uma dependência total de Cristo. Ele descobriu que sua paz e satisfação não dependiam das circunstâncias externas, mas de sua união com Cristo, que o fortalecia tanto na fartura quanto na escassez. 

Essa atitude de suficiência em Cristo foi aprendida ao longo de suas experiências, marcadas por desafios como prisões, perseguições, fome e, também, nos momentos de bênçãos e provisão. O contentamento descrito por Paulo não é uma indiferença às circunstâncias ou uma negação do sofrimento, mas uma confiança firme de que, em qualquer situação, Cristo é suficiente. Essa confiança é fundamentada na soberania de Deus, que sustenta e dirige todas as coisas para o bem daqueles que O amam (Romanos 8:28).

Então, como cristãos que vivem em uma sociedade consumista, podemos aprender algumas lições preciosas com Paulo, pois se compreendermos esse segredo nossa vida será totalmente transformada. Assim vejamos:

  • Desenvolva um relacionamento íntimo com Cristo. O contentamento de Paulo não veio de uma fórmula ou prática externa, mas de uma comunhão profunda com Cristo. Isso requer tempo em oração, leitura da Bíblia e meditação, buscando uma conexão viva com o Senhor.
  • Reconheça a soberania e a provisão de Deus. O contentamento cresce quando confiamos que Deus está no controle de todas as circunstâncias. Podemos descansar na certeza de que Ele suprirá nossas necessidades segundo Sua vontade (Filipenses 4:19).
  • Adote uma perspectiva eterna. Muitas insatisfações decorrem de um foco excessivo nas coisas temporais. Quando direcionamos nossa atenção para as promessas eternas de Deus, valorizamos o que realmente importa e mudamos nossa maneira de encarar ganhos e perdas.
  • Pratique a gratidão. Desenvolver um coração grato ajuda a combater a insatisfação e nos permite reconhecer as bênçãos de Deus, por menores que pareçam. 
  • Enfrente as provações com fé. Assim como Paulo, podemos aprender o contentamento nas adversidades. Essas experiências moldam nosso caráter e fortalecem nossa confiança em Deus. 
  • Combata a comparação. Em uma cultura saturada pelas redes sociais, onde a vida alheia parece sempre melhor, a comparação é uma inimiga do contentamento. Devemos focar em nossa caminhada com Deus, sem nos comparar aos outros.

Os reformados enfatizam que o contentamento de Paulo está fundamentado na união com Cristo. João Calvino, por exemplo, destacou que, estando em Cristo, o crente possui tudo o que é necessário para sua plena satisfação, independentemente das condições externas. 

Teólogos contemporâneos, como John Piper, reforçam que o contentamento é um aprendizado, resultado de confiar na soberania de Deus. Piper afirma: “a alegria e o contentamento vêm de ver a mão de Deus em tudo e saber que Ele está trabalhando para o nosso bem, mesmo nas provações”. 

Em suma, Filipenses 4:12-13 nos desafia a reavaliar nossas prioridades e a encontrar em Cristo a força para viver uma vida de contentamento. O segredo que Paulo aprendeu e compartilha conosco é simples, mas profundo: a suficiência e a força que vêm de um relacionamento íntimo com Cristo nos capacitam a enfrentar qualquer circunstância. Que possamos, como Paulo, declarar com confiança: “Tudo posso naquele que me fortalece”. Viva no contentamento do SENHOR, porque Ele tem cuidado de nós. 

Lembre-se: Rendam graças ao SENHOR, pois Ele é bom; o seu amor dura para sempre.

Sola Scriptura - Solus Christus - Sola gratia - Sola fide e Soli Deo glória

SHALOM ADONAI

domingo, 11 de maio de 2025

Viver pela fé em um mundo incerto

 

Está escrito em Habacuque 2:4 (NVI):

Veja, o ímpio está envaidecido, e os seus desejos não são bons! Mas o justo viverá por sua fé

 

Vivemos em um mundo de incertezas. Guerras, crises econômicas, doenças, insegurança e mudanças culturais aceleradas lançam o ser humano em um constante estado de inquietação. A fé cristã, contudo, não é alicerçada nas circunstâncias passageiras do mundo, mas na fidelidade imutável de Deus. O profeta Habacuque também viveu em um tempo de grande confusão e injustiça. A resposta de Deus a ele não foi imediata, mas foi clara: “O justo viverá por sua fé”. Essa frase ecoa como um convite divino à confiança inabalável em Deus - não nas circunstâncias. 

Habacuque era um profeta angustiado com a maldade de Judá e perplexo com a resposta divina de levantar os caldeus (um povo ainda mais ímpio) como instrumento de juízo. No capítulo 2, Deus responde ao profeta com uma visão que deveria ser registrada e aguardada com paciência, pois certamente se cumpriria (v.3). No versículo 4, Deus contrasta o arrogante (ímpio) com o justo. Enquanto o ímpio confia em si mesmo, o justo vive pela fé – ou seja, depende inteiramente da fidelidade de Deus, mesmo quando não entende o que Ele está fazendo.

A expressão “o justo viverá por sua fé” enfatiza que a vida autêntica diante de Deus não se baseia no poder humano, mas em uma dependência contínua dEle. Como observa o teólogo John Piper: “A fé é a resposta humilde à soberania de Deus, reconhecendo que Ele é quem governa a história”. 

O apóstolo Paulo retoma Habacuque 2:4 em Romanos 1:17 para fundamentar a doutrina da justificação pela fé: “o justo viverá por sua fé”. Aqui, a fé não é apenas confiança passiva, mas o meio pelo qual o pecador é justificado e mantém sua comunhão com Deus. Em Gálatas 3:11, Paulo reforça que a lei não justifica ninguém, mas sim “o justo viverá por sua fé”. 

O autor de Hebreus (10:38) também cita Habacuque, exortando os crentes a perseverarem em meio às tribulações, pois “o meu justo viverá pela fé”. Essas citações mostram que a fé é o fundamento da vida cristã – desde a salvação até a perseverança.

Como destaca o teólogo Walter C. Kaiser Jr., “Habacuque aprendeu que a fé é a resposta correta quando a ação de Deus não parece fazer sentido para nós”. Viver pela fé é continuar confiando, mesmo quando os céus parecem silenciosos. Por sua vez, Timothy Keller comenta que a fé verdadeira não nega as dificuldades, mas confia na bondade de Deus em meio ao sofrimento. Alinhado com essa perspectiva, Karl Barth enfatizou que viver pela fé significa reconhecer que Deus está no controle, mesmo quando o mundo parece caótico.

A frase “o justo viverá por sua fé” tornou-se central na teologia cristã, especialmente por ter sido citada no Novo Testamento. Mas que implicações essa verdade tem para o cristão contemporâneo?

  • Confiança em Deus em tempos de incertezas. Mesmo diante das crises mundiais sejam econômicas, sociais, bélicas ou pessoais – o justo não se desespera, pois sabe que Deus é fiel (Salmo 23:1; Filipenses 4:6-7).
  • Fidelidade em meio às dificuldades. Fé não é passividade, mas ação alinhada aos valores do Reino. Assim como Abraão, que saiu de sua terra “sem saber para onde ia” (Hebreus 11:8), o justo vive com coragem, mesmo sem garantias visíveis.
  • Resistência ao individualismo e ao consumismo. O mundo exalta o sucesso pessoal e a autossuficiência, mas a fé bíblica é comunitária e generosa (Atos 2:44-45). O justo vive para abençoar outros, não para acumular bens.
  • Esperança na promessa final. A fé olha além das circunstâncias temporais e se firma na promessa de redenção total (Romanos 8:24-25). Como Habacuque, o cristão pode declarar: “Ainda que a figueira não floresça... Eu me alegrarei no Senhor!” (HC 3:17-18).

Nos dias de hoje, os cristãos têm sua fé constantemente desafiada, mas Habacuque oferece orientações práticas:

1Diante das crises. A fé não ignora os problemas, mas encontra paz em meio a eles. Somos chamados a confiar no Senhor mesmo quando os fundamentos da sociedade parecem ruir (cf. Salmo 11:3).

2. Na vida pessoa. Em tempos de desemprego, enfermidades, luto ou solidão, viver pela fé é lembrar que “Deus é o nosso refúgio e fortaleza, socorro bem presente na angústia” (Salmo 46:1) 

3. Na conduta ética e moral. Em um mundo que relativiza a verdade, viver pela fé significa andar em integridade, mesmo que isso custe rejeição. A fé genuína produz frutos de justiça.

4. Na missão da igreja. Em contextos em que o evangelho é rejeitado, a igreja é chamada a perseverar, lembrando-se de que “sem fé é impossível agradar a Deus” (Hebreus 11:6). A fé sustenta a pregação, a oração e o discipulado.

Diante o exposto, podemos concluir que viver pela fé em um mundo incerto é um chamado à confiança profunda no caráter de Deus. É crer que, apesar das trevas ao redor, o Senhor permanece soberano, justo e fiel. A fé do justo não é passiva, mas ativa, perseverante e transformadora. Assim como Habacuque aprendeu a descansar em Deus, mesmo sem compreender plenamente Seus caminhos, somos desafiados a fazer o mesmo. Seja diante de crises pessoais ou coletivas, somos chamados a viver não por vista, mas firmados nas promessas de Deus. 

A fé não anula a incerteza, mas redefine seu significado: não caminhamos às cegas, mas com os olhos fixos em Cristo, “autor e consumador da fé” (Hebreus 12:2).

Referências:

KAISER, Jr., W.C. Micah, Nahum, Habakkuk, Zephaniah, Haggai, Zechariah, Malachi (The Preacher’s Commentary, Volume 23). Thomas Nelson, 2002.

KELLER, T. A fé na era do ceticismo. São Paulo: Vida Nova, 2015.

BARTH, K. Carta aos Romanos. São Paulo: Templus, 2017.

 

Lembre-se: Rendam graças ao SENHOR, pois Ele é bom; o seu amor dura para sempre.

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Christós kyrios

 

domingo, 4 de maio de 2025

Virtudes cristãs: uma reflexão em Colossenses 3:12



Está escrito em Colossenses 3:12 (NVI): 

Portanto, como escolhidos de Deus, santos e amados, vistam-se de profunda compaixão, bondade, humildade, mansidão e paciência”.

 

O versículo em pauta nos convoca a vestir-nos de virtudes essenciais para a vida cristã. Este chamado serve como um lembrete da nossa identidade em Cristo e das qualidades que devemos manifestar como seguidores de Jesus. Esta breve reflexão busca explorar cada uma dessas virtudes à luz das Escrituras e do pensamento teológico, além de discutir como o cristão pode incorporá-las em sua vida diária.


Observemos que os escolhidos de Deus são santos e amados. Na Bíblia, a palavra “santos”, do grego “hagios”, significa “separados” ou “consagrados”. Os cristãos são chamados de santos porque foram separados por Deus para viver uma vida dedicada a Ele. Esta separação é tanto uma posição quanto um processo. Explico: a posição de santidade é um status conferido por Deus aos crentes em Cristo. Paulo frequentemente se refere aos cristãos como santos sem suas cartas, como exemplificado em 1 Coríntios 1:2. 


Os crentes são santificados em Cristo no momento da conversão, quando são justificados pela fé. Esta é uma obra da graça de Deus, que nos separa do pecado e nos coloca em uma posição de santidade diante Dele.


Além disso, a santidade é um processo contínuo, conhecido como santificação. Este é o trabalho do Espírito Santo em nossas vidas, nos transformando à imagem de Cristo. Em 1 Tessalonicenses 4:3, Paulo declara: “A vontade de Deus é que sejam santificados”. 


Os escolhidos de Deus também são profundamente amados. Este amor é a base da nossa salvação e do relacionamento contínuo com Deus. O amor de Deus pelos Seus escolhidos é eterno e incondicional. Este amor eterno é a base da eleição divina, conforme Jeremias 31:3 e Efésios 1:4-5. 


Além disso, o amor de Deus se manifesta de forma suprema na redenção. João 3:16 declara: “Porque Deus amou o mundo de tal maneira que deu o seu Filho unigênito, para que todo o que nele crê não pereça, mas tenha a vida eterna”. Este amor redentor é a motivação para a encarnação, morte e ressurreição de Jesus Cristo.


Portanto, essa identidade como santos e amados deve moldar a maneira como vivemos. Devemos buscar refletir a santidade e o amor de Deus em nossas vidas, vivendo de acordo com a nossa posição em Cristo e permitindo que o Espírito Santo nos transforme cada dia mais à Sua imagem. 


A segunda parte do versículo enfatiza a necessidade de nos revestirmos de profunda compaixão, bondade, humildade, mansidão e paciência. Vejamos cada uma dessas virtudes: 


A compaixão é um sentimento de profunda empatia e preocupação pelas necessidades dos outros. Em Mateus 9:36, lemos que Jesus “ao ver as multidões, teve compaixão delas, porque estavam aflitas e desamparadas, como ovelhas sem pastor”. A compaixão de Jesus é um exemplo supremo para nós, mostrando que devemos nos preocupar genuinamente com o bem-estar dos outros.


O teólogo Dietrich Bonhoeffer destaca que a compaixão cristã não é apenas um sentimento, mas uma ação: “O Cristo sofredor nos chama a segui-lo no caminho da compaixão e da solidariedade com os sofredores”. Portanto, vestir-se de compaixão é ser movido a agir em benefício daqueles que estão em necessidade.


A bondade refere-se a atitudes e ações que refletem benevolência e generosidade. Em Gálatas 5:22, a bondade é listada como um fruto do Espírito, indicando que ela é uma evidência do trabalho do Espírito Santo em nossas vidas. A bondade cristã se manifesta em ações práticas de amor ao próximo, como demonstrado na parábola do Bom Samaritano (Lucas 10:25-37), onde o samaritano cuida de um homem ferido sem esperar nada em troca.


A humildade é a virtude de reconhecer a nossa dependência de Deus e a nossa condição de servos. Filipenses 2:3-4 nos exorta: “Nada façam por ambição egoísta ou por vaidade, mas humildemente considerem os outros superiores a vocês mesmos, cuidando, cada um, não somente dos próprios interesses, mas também dos interesses dos outros”.


C.S. Lewis descreveu a humildade como “não pensar menos de si mesmo, mas pensar menos em si mesmo”. A verdadeira humildade nos leva a servir aos outros com um coração sincero, colocando suas necessidades acima das nossas.


A mansidão é frequentemente mal interpretada como fraqueza, mas na verdade é uma força controlada. Jesus se descreve como “manso e humilde de coração” em Mateus 11:29. A mansidão é a capacidade de mostrar gentileza e autocontrole, mesmo em situações de conflito. Vestir-se de mansidão é responder com gentileza e paciência, mesmo quando somos provocados ou maltratados.


A paciência é a capacidade de suportar dificuldades e esperar com perseverança. Tiago 1:4 nos encoraja: “No entanto, a perseverança deve ter ação completa, a fim de que vocês sejam perfeitos e íntegros, sem que lhes falte coisa alguma”. A paciência cristã é demonstrada na espera confiante pelo tempo de Deus e na perseverança diante das adversidades.


Para que o cristão se vista dessas virtudes, é essencial uma vida de comunhão com Deus através da oração, leitura da Bíblia e participação na comunidade de fé. Vejamos algumas sugestões práticas:


1. Profunda compaixão: envolva-se em atividades de serviço comunitário, oferecendo seu tempo e recursos para ajudar os necessitados.

2. Bondade: pratique atos de gentileza diariamente, seja ajudando um vizinho, encorajando um colega de trabalho ou simplesmente mostrando gratidão.

3. Humildade: desenvolva a humildade através do serviço, procurando oportunidades para servir aos outros de maneira desinteressada.

4. Mansidão: cultive a mansidão aprendendo a controlar suas reações em situações de conflito, respondendo com gentileza e calma.

5. Paciência: pratique a paciência ao lidar com situações desafiadoras, confiando no tempo de Deus e mantendo uma atitude positiva.


Enfim, Colossenses 3:12 nos chama a viver de acordo com a nossa identidade em Cristo, manifestando virtudes que refletem o caráter de Deus. Ao nos vestirmos de profunda compaixão, bondade, humildade, mansidão e paciência, testemunhamos ao mundo o amor e a graça de Deus. Que possamos buscar diariamente a transformação pelo Espírito Santo, permitindo que essas virtudes se tornem cada vez mais evidentes em nossas vidas.


Referências:

BONHOEFFER, D. Vida em comunhão. São Leopoldo: Sinodal, 2009.

LEWIS, C.S. Cristianismo puro e simples. São Paulo: Martins Fontes, 2009. 

 

Lembre-se: Rendam graças ao SENHOR, pois Ele é bom; o seu amor dura para sempre.

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Christós Kyrios

domingo, 27 de abril de 2025

Identidade em Cristo: a nova criação redefinida pelo Evangelho


 

Está escrito em 2 Coríntios 5:17, NVI: “Portanto, se alguém está em Cristo, é nova criação. As coisas antigas já passaram; eis que surgiram coisas novas!

 

A busca por identidade é uma característica inerente à experiência humana. Em um mundo fragmentado por crises existenciais, inseguranças e promessas ilusórias de realização pessoal, a Palavra de Deus oferece uma resposta transformadora e definitiva: a verdadeira identidade do ser humano é encontrada em Cristo. 

O apóstolo Paulo, ao escrever aos coríntios, declara que estar em Cristo é ser uma nova criação. Ele não está falando apenas de uma mudança de comportamento ou de hábitos. Trata-se de uma transformação interior – um novo começo que só o Espírito Santo pode operar em nós. Em Cristo, você não é mais definido pelo seu passado, pelos seus pecados, nem pelas marcas que a vida deixou em você. Sua identidade agora é definida por quem Deus diz que você é: um filho amado, perdoado e transformado. Essa nova realidade redefine completamente quem somos, como vivemos e a quem pertencemos. 

Ser nova criação é nascer espiritualmente para uma nova realidade. É como se Deus dissesse: “Vamos começar de novo, mas agora do meu jeito”. O que ficou para trás – a culpa, os erros, os medos, a vida sem propósito – já passou. Agora, em Cristo, tudo se faz novo: um novo coração, novos pensamentos, novos desejos, um novo caminho. 

Esse processo é tão radical que Paulo chega a afirmar em Gálatas 2:20 (NVI): “Estou crucificado com Cristo. Assim, já não sou eu quem vive, mas Cristo vive em mim. A vida que agora vivo no corpo, vivo-a pela fé no Filho de Deus, que me amou e se entregou por mim”. Ou seja, nossa identidade está agora ligada a Jesus. É Ele quem nos define.

No contexto da carta, Paulo trata da reconciliação entre Deus e o homem, tendo Cristo como mediador desse novo relacionamento. A expressão “nova criação” não denota uma mera reforma moral ou uma melhora de comportamento, mas uma transformação radical da natureza humana. Não se trata de um conserto, e sim de um recomeço espiritual.

Segundo o teólogo John Stott, “a conversão é mais do que uma mudança de comportamento; é uma mudança de identidade”. Em Cristo, o velho homem – marcado pelo pecado, culpa e alienação de Deus – morre, e um novo ser, reconciliado e regenerado, nasce pela graça (cf. Efésios 2:4-6).

A frase “as coisas antigas já passaram” refere-se à vida anterior do crente, dominada pelo pecado, pelo egoísmo e pela alienação espiritual. Trata-se de um rompimento com o passado sem Deus. Essa ruptura é tão profunda que Paulo, ao descrever sua própria conversão, fala como alguém que morreu para si mesmo, como vimos em Gálatas 2:20.

A parte final do versículo – “eis que se fizeram novas” – aponta para a realidade presente e contínua do viver cristão. O novo nascimento implica um novo modo de pensar (Romanos 12:2), novos desejos (Salmo 37:4), uma nova ética (Colossenses 3:9-10) e uma nova comunidade de pertencimento – o corpo de Cristo (1 Coríntios 12:27). 

Wayne Grudem, em sua Teologia Sistemática, destaca que a nova criação implica uma mudança de coração operada pelo Espírito Santo, que afeta todas as áreas da vida do cristão: seus afetos, decisões, relacionamentos e propósitos.

Na prática, isso significa:

  • Você não precisa mais viver preso ao que foi.
  • Sua autoestima não depende da opinião dos outros, mas do valor que Deus te deu.
  • Seus dias não são guiados por culpa ou medo, mas por fé e esperança.
  • Seu estilo de vida é moldado não pelo mundo, mas pela Palavra de Deus.

A nova criação busca refletir o caráter de Cristo no cotidiano: na maneira de falar, de tratar as pessoas, de perdoar, de amar, de servir. 

Agora, pare e pense

1. Você tem vivido como quem é uma nova criação? Ou tem se deixado definir por culpas antigas, feridas ou inseguranças?

2. O que precisa “ficar para trás” na sua vida, para que o novo de Deus possa florescer?

3. Quem você conhece que precisa descobrir essa nova identidade em Cristo?

Diante de uma sociedade que define identidade com base em aparências, status, conquistas ou preferências subjetivas, a verdade bíblica oferece um fundamento estável e eterno: o cristão é quem Deus diz que ele é. 

Ser uma nova criação significa:

  • Viver com propósito: a nova identidade traz uma missão – reconciliar o mundo com Deus (2 Coríntios 5:18-20).
  • Viver em santidade: como nova criação, somos chamados à integridade, abandonando velhos padrões e cultivando o fruto do Espírito (Gálatas 5:22-23).
  • Viver sem condenação: a nova identidade elimina a culpa do passado: “Agora, pois, já nenhuma condenação há para os que estão em Cristo Jesus” (Romanos 8:1).
  • Viver em comunidade: a nova criação é parte do Corpo de Cristo e integrada a uma nova família espiritual.
  • Resistir às mentiras do mundo: o cristão não precisa mais se definir por fracassos, traumas ou rótulo sociais.

Essa nova identidade traz impactos abrangentes e libertadores, por exemplo:

  • Na autoestima: o cristão sabe que é amado e aceito por Deus, não por méritos, mas por graça.
  • Nas decisões: a nova criação busca agradar a Deus e não a si mesmo (2 Coríntios 5:9).
  • No sofrimento: mesmo em meio às tribulações, o crente não se desespera, pois, sua esperança está em Cristo (2 Coríntios 4:16-18).
  • Na ética: o novo homem manifesta justiça, misericórdia e verdade no dia a dia. 
  • Na missão: o cristão se torna embaixador de Cristo, convidando outros a também receberem essa nova identidade

Ser uma nova criação em Cristo é mais do que uma declaração teológica: é uma realidade espiritual que redefine completamente a vida do cristão. As coisas antigas – pecado, culpa, medo e vazio – ficaram para trás. Em seu lugar, surgiu uma nova vida fundamentada na graça, vivida pela fé e impulsionada pelo amor de Deus. 

Com essa identidade renovada, o cristão é chamado a viver de forma digna do Evangelho, sendo luz em meio às trevas e proclamador da reconciliação em um mundo que ainda clama por sentido e redenção.

Permita-me orar com você:

Senhor Jesus, obrigado porque em Ti eu sou uma nova criação.

Ajuda-me a abandonar o passado e a viver com os olhos fixos na nova vida que o Senhor me oferece.

Que a Tua verdade me lembre, todos os dias, de quem eu sou: Teu filho, amado, perdoado e transformado.

Ensina-me a viver de acordo com essa identidade e a compartilhar com outros essa maravilhosa graça.

Em Teu nome, amém!

Referência:

STOTT, J. A mensagem de 2 Coríntios. São Paulo: ABU, 1985.

 

Lembre-se: Rendam graças ao SENHOR, pois Ele é bom; o seu amor dura para sempre.

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Christós kyrios

 

domingo, 20 de abril de 2025

Tenham coragem! Cristo venceu o mundo


Está escrito em João 16:33 (NVI): “Eu disse isso para que em mim vocês tenham paz. Neste mundo, vocês terão aflições; contudo, tenham coragem! Eu venci o mundo”.

 

Essa passagem faz parte do discurso final de Jesus aos seus discípulos antes de sua prisão e crucificação. O contexto imediato está inserido no conjunto de ensinamentos conhecidos como o “Discurso de Despedida” (João 13-16), no qual Jesus prepara seus seguidores para sua ausência física e promete o Espírito Santo como Consolador.

Ao analisarmos esse versículo, identificamos três afirmações essenciais de Jesus:

a) “Eu disse isso para que em mim vocês tenham paz” - Jesus enfatiza que a verdadeira paz não está nas circunstâncias, mas em um relacionamento com Ele. 

b) “Neste mundo, vocês terão aflições” – Ele não promete isenção do sofrimento; pelo contrário, alerta que dificuldades são inevitáveis.

c) “Contudo, tenham coragem! Eu venci o mundo” – A vitória de Cristo é o fundamento da coragem do crente, pois Ele venceu o pecado, a morte e o mal.

O verbo “terão” (grego echēte) indica certeza de dificuldades, enquanto “tenham coragem” (tharseite) é uma exortação direta à perseverança e confiança.

Ao interpretarmos esse versículo, percebemos que Jesus não minimiza o sofrimento, mas aponta para a paz e vitória que estão Nele. Essa paz não é a simples ausência de problemas, mas a segurança interior que provém de um relacionamento com Deus.

A promessa “Eu venci o mundo” aponta para a obra redentora de Cristo. A expressão “mundo” (kosmos) pode referir-se tanto à criação como ao sistema que se opõe a Deus. Assim, a vitória de Jesus representa a superação do pecado, da morte e do mal.

Diante desse cenário, surge a pergunta: por que a vitória de Cristo deve nos motivar a termos coragem para enfrentar os desafios do mundo moderno? Essa vitória não é apenas um evento passado, mas uma realidade presente e futura que garante nossa segurança e esperança. Ao vencer o pecado, a morte e as forças do mal, Jesus demonstrou que nenhuma adversidade pode nos separar do amor de Deus (Romanos 8:38-39). Essa certeza fortalece os crentes para enfrentarem perseguições, crises e incertezas.

Além disso, a ressurreição de Cristo prova que o sofrimento neste mundo é temporário e que a glória futura supera qualquer dificuldade presente (2 Coríntios 4:17). Como crentes, não enfrentamos as adversidades sozinhos, pois temos o Espírito Santo como Consolador e Guia (João 14:16-17).

No mundo atual, onde o medo, a ansiedade e o pessimismo frequentemente dominam, a vitória de Cristo nos ensina a perseverar com fé. Como afirmou John Piper, “quando Cristo venceu o mundo, Ele garantiu que nenhum sofrimento pode nos destruir; pelo contrário, Deus usa as tribulações para nos moldar à imagem de Cristo” (cf. Romanos 8:29).

Agostinho de Hipona destaca que a paz de Cristo é diferente da paz mundana, pois “a verdadeira paz vem de uma confiança inabalável em Deus”. Da mesma forma, Martyn Lloyd-Jones afirma que a paz cristã está enraizada na soberania de Deus, mesmo em tempos de tribulação.

Portanto, a coragem que Jesus nos ordena ter não se baseia em nossa força, mas na certeza de que Ele já venceu. Isso nos capacita a viver com ousadia, testemunhar nossa fé sem medo e enfrentar qualquer adversidade com a paz que excede todo entendimento (cf. Filipenses 4:7). 

Diante disso, João 16:33 permanece altamente relevante em um mundo marcado por crises econômicas, conflitos, perseguições políticas e religiosas, além de desafios pessoais. Algumas lições que podemos aplicar em nossa jornada de fé incluem:

  1. Confiança na soberania de Deus – Diante das dificuldades, devemos lembrar que Cristo já venceu o mal.
  2. Paz em meio à incerteza – No caos do mundo moderno, a paz de Cristo é um refúgio seguro.
  3. Coragem para testemunhar – Mesmo sob oposição, somos chamados a proclamar a vitória de Cristo.
  4. Resiliência espiritual – Devemos perseverar sabendo que nossa esperança é eterna.

Amados, João 16:33 é um chamado à coragem e à confiança no triunfo de Cristo. A paz que Ele oferece não depende das circunstâncias, mas de nossa relação com Ele. Assim, os crentes podem enfrentar o mundo com esperança, sabendo que a última palavra não pertence às tribulações, mas ao Cristo ressurreto, que venceu todas as coisas.

Além disso, essa certeza deve transformar a maneira como vivemos, impulsionando-nos a uma fé ativa e corajosa. Não estamos sozinhos em nossas lutas; a vitória de Cristo nos capacita a enfrentar cada desafio com a convicção de que nada pode nos separar do amor de Deus (cf. Romanos 8:38-39). Portanto, devemos seguir firmes, vivendo com a paz que excede todo entendimento e confiando que, independentemente das aflições presentes, Cristo já assegurou nossa vitória final.


Referências:

AGOSTINHO, S. A cidade de Deus. São Paulo: Paulus, 1990.

PIPER, J. Future grace: the purifying power of the promises of God. Colorado Springs: Multnomah Books, 1995.

LLOYD-JONES, M. Spiritual depression: its causes and cure. Grand Rapids: Wm. B. Eerdmans Publishing Co., 1965.


Lembre-se: Rendam graças ao SENHOR, pois Ele é bom; o seu amor dura para sempre.

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Christós kyrios

domingo, 13 de abril de 2025

Glorificando a Deus em todas as coisas: uma abordagem teológica e prática



Está escrito em 1Coríntios 10:31 (NVI): “Assim, quer vocês comam, quer bebam, quer façam qualquer outra coisa, façam tudo para a glória de Deus”.


A Primeira Epístola aos Coríntios foi escrita pelo apóstolo Paulo para abordar problemas éticos, doutrinários e práticos na igreja de Corinto, uma cidade portuária e comercialmente ativa, onde a influência da cultura pagã era forte. No capítulo 10, Paulo discute a liberdade cristã em relação ao consumo de alimentos sacrificados aos ídolos (1Co 8-10). Alguns coríntios, baseados em seu “conhecimento” (8:1), julgavam-se livres para comer tais alimentos, enquanto outros, com consciência mais fraca, se escandalizavam.

Paulo, então, admoesta que, embora os ídolos não tenham poder real (10:19-20), os cristãos devem considerar o bem do próximo (10:24) e evitar a idolatria (10:14). O versículo 31 surge como um princípio abrangente: todas as ações devem ser feitas “para a glória de Deus”, transcendendo disputas sobre liberdade individual.

1 Coríntios 10:31 enfatiza a abrangência da responsabilidade do crente em sua conduta. A expressão “façam tudo” indica que não apenas as práticas religiosas, mas também as atividades cotidianas devem ser realizadas como um propósito maior: a glória de Deus. Esse ensinamento ecoa o conceito de uma vida integralmente voltada para Deus, sem separação entre sagrado e secular. 

O texto estabelece que até mesmo nossas atividades do dia a dia (como comer e beber) devem ser realizadas com o propósito de honrar a Deus. A vida cristã é integral e deve refletir a soberania de Deus (Cl 3:17). Paulo já havia ensinado que o corpo é templo do Espírito (1Co 6:19-20), reforçando que até atos físicos têm dimensão espiritual.

O teólogo John MacArthur destaca que Paulo orienta os crentes a fazerem todas as coisas para a glória de Deus como um princípio básico da vida cristã, enfatizando que isso implica evitar atitudes que possam prejudicar a fé de outros. Matthew Henry, por sua vez, comenta que a glória de Deus deve ser o fim último de todas as nossas ações, não buscando satisfação própria, mas promovendo o bem-estar espiritual dos outros.

Talvez você esteja se perguntando: o que significa fazer tudo para a glória de Deus? Essa expressão significa viver de modo que cada pensamento, palavra e ação reflita o caráter de Deus, honre Seu nome e promova Seu reino. Trata-se de uma postura integral que reconhece a soberania de Deus em todas as áreas da vida. Em outras palavras, “glorificar a Deus” significa manifestar Sua excelência, reconhecendo-O como digno de adoração em tudo (Sl 29:2; Ap 4:11).  Não é sobre performance, mas de motivação e propósito: agir com consciência de que Ele é o centro (Cl 3:17).

Vamos exemplificar: 

  • Um enfermeiro cristão trata pacientes com compaixão, não apenas por dever, mas como testemunho do cuidado de Deus. Princípio: Trabalhar com integridade e excelência, como “para o Senhor” (Cl 3:23). 
  • Uma pessoa evita sonegar impostos, mesmo quando não fiscalizado, porque crê que a honestidade glorifica a Deus. Princípio: Usar recursos com sabedoria, generosidade e gratidão (Pv 3:9; 2Co 9:7).
  • Optar por filmes, músicas ou hobbies que edificam, em vez de conteúdos que corrompem a mente (Fp 4:8). Princípio: “Tudo me é permitido, mas nem tudo convém” (1 Co 10:23).

Esses exemplos demonstram que glorificamos a Deus quando fazemos a coisa certa. Pergunte-se: Isso honra a Deus ou apenas a mim? (1 Co 10:33). Use sua influência para apontar outros a Cristo (Mt 5:16). Como disse Lutero: “O leiteiro glorifica a Deus quando ordenha as vacas com fé”. 

Diante do exposto, que lições podemos extrair de 1 Co 10:31? Pelo menos quatro aspectos:

  1. A glória de Deus como princípio central: O cristão não deve viver para agradar a si mesmo, mas para glorificar a Deus em tudo.
  2. Responsabilidade na liberdade cristã: Nem tudo o que é permitido edifica (1Co 10:23); devemos considerar o impacto de nossas ações na vida dos outros.
  3. Santidade no cotidiano: O chamado para glorificar a Deus não se restringe ao culto, mas se estende às ações mais comuns do dia a dia.
  4. Testemunho cristão: Viver para a glória de Deus é uma forma de testemunho diante do mundo, refletindo os valores do Reino.

Como podemos viabilizar na prática essas lições? Vejamos:

  • No trabalho: Agir com ética, honestidade e comprometimento, reconhecendo que todo trabalho pode ser uma forma de serviço a Deus.
  • No lar: Cultivar um ambiente de amor, respeito e educação cristã entre os familiares.
  • No consumo: Ter moderação e discernimento na alimentação, nas finanças e no entretenimento.
  • Nos relacionamentos: Buscar edificar os irmãos na fé e evitar atitudes que possam ser pedra de tropeço.

Em suma, 1Co 10:31 é um princípio fundamental da vida cristã. Ele nos desafia a enxergar cada aspecto da nossa existência como um ato de adoração e serviço a Deus. Quando vivemos para Sua glória, encontramos verdadeiro sentido e propósito na caminhada cristã. O apóstolo Paulo nos ensina que cada decisão e atitude devem ser tomadas considerando o impacto que terão na comunhão com Deus e no testemunho cristão diante do mundo. 

Assim, ao aplicarmos esse ensinamento no dia a dia, reconhecemos que glorificar a Deus não é algo restrito aos momentos de culto ou atividades ministeriais, mas uma postura que permeia toda a vida. Seja no trabalho, nos relacionamentos, nos momentos de lazer ou nas decisões do cotidiano, tudo deve convergir para a exaltação do nome do Senhor.


Referências:

MACARTHUR, J. The MacArthur new testament commentary: 1 Corinthians. Chicago: Moody Publishers, 1984.

HENRY, M. Matthew Henry’s Commentary on the Whole Bible. Peabody: Hendrichson Publishers, 1991.


Lembre-se: Rendam graças ao SENHOR, pois Ele é bom; o seu amor dura para sempre.

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Christós kyrios

domingo, 6 de abril de 2025

Liberdade e limites: a ética Paulina em 1Coríntios 6:12


Está escrito em 1Coríntios 6:12 (NVI): “Tudo me é permitido, mas nem tudo convém. Tudo me é permitido, mas eu não deixarei que nada me domine”.

A liberdade cristã é um dos temas centrais do Novo Testamento e um aspecto fundamental da vida do crente. A passagem de 1 Coríntios 6:12, frequentemente citada em debates sobre moralidade e comportamento cristão, traz implicações profundas sobre a responsabilidade pessoal e os limites da liberdade em Cristo.

Escrito no contexto de uma comunidade dividida por questões morais e pela influência da libertinagem, essa passagem reflete a tensão entre liberdade e responsabilidade no Evangelho. A cidade de Corinto era um centro cosmopolita do mundo greco-romano, marcado pela sua diversidade cultural, idolatria e imoralidade sexual. Alguns cristãos coríntios, influenciados por uma interpretação distorcida da graça (cf. Romanos 6:1-2), argumentavam que a liberdade cristã os autorizava a qualquer comportamento, incluindo a prostituição cultual (1Coríntios 5:15-18) e litígios entre irmãos (1Coríntios 6:1-8). Diante disso, Paulo escreve essa carta para corrigir desvios de conduta e enfatizar princípios essenciais da santidade e do viver em Cristo.

A expressão “tudo me é permitido” parece ter sido um ditado comum entre os crentes de Corinto, usado para justificar comportamentos questionáveis. Paulo responde a essa lógica com duas ressalvas fundamentais:

1. Nem tudo convém – Nem tudo que é permitido é benéfico para a vida cristã, seja para o próprio crente ou para a comunidade da fé.

2. Nada me dominará – A verdadeira liberdade não significa ser escravizado pelos desejos e prazeres da carne, mas sim ter autocontrole em todas as áreas da vida.

Paulo deixa claro que a graça não é licença para pecar. Pelo contrário, o cristão deve agir com responsabilidade, considerando se suas escolhas edificam e se são compatíveis com o chamado para a santidade.

Diante desse ensinamento paulino, podemos extrair algumas lições fundamentais de 1Coríntios 6:12:

a) A liberdade cristã tem limites – Em Cristo, o crente está livre da condenação da lei, mas essa liberdade deve ser exercida com discernimento e responsabilidade. Nem tudo o que é legal ou possível de se fazer deve ser praticado.

b) A santidade como prioridade – O foco da vida cristã deve ser agradar a Deus e viver conforme Seus princípios. A liberdade deve sempre estar subordinada à busca da santidade.

d) O perigo da escravidão espiritual – Muitos hábitos aparentemente inofensivos podem acabar dominando a vida do crente. Vícios, cobiça, orgulho e outras práticas podem se tornar senhores tiranos se não forem controlados.

e) Responsabilidade comunitária – O cristão não vive isoladamente. Suas escolhas impactam a comunidade de fé, e é necessário considerar se determinadas ações podem se tornar tropeço para outros irmãos.

Atualmente, a interpretação equivocada da liberdade cristã ainda é recorrente. Muitos justificam escolhas questionáveis com a ideia de que “Deus é amor” e que “a graça cobre tudo”. No entanto, as palavras de Paulo ecoam com urgência em nossa era, marcada por um individualismo radical e uma cultura que frequentemente confunde liberdade com libertinagem. 

Diante desse contexto, podemos destacar três desafios práticos que esse texto nos apresenta para o século XXI:

1. Rejeitar o consumismo desenfreado – Vivemos em uma sociedade que estimula o consumo como caminho para a felicidade, sob o lema “compre, porque você merece”. No entanto, Paulo adverte que a liberdade não pode ser escravizada pelos desejos materiais.

  • A escravidão do ter: O endividamento excessivo, a obsessão por posses e a busca incessante por status financeiro muitas vezes dominam as prioridades do homem moderno, contradizendo Mateus 6:24 (“Ninguém pode servir a dois senhores [...] Não podeis servir a Deus e às riquezas”).
  • Moderação como virtude cristã: O apóstolo ensina que a verdadeira prosperidade não está na acumulação, mas na suficiência (1Timóteo 6:6-8). O cristão deve perguntar-se: “Esse consumo é necessário, ou estou sendo controlado por ele?”. 

Exemplo prático: Optar por um estilo de vida simples, evitar compras por impulso e priorizar investimentos no Reino de Deus (como ofertas e ajuda ao próximo) são formas de viver a liberdade responsável.

2. Questionar a moralidade cultural – A pós-modernidade relativizou os conceitos de certo e errado, normalizando comportamentos que a Bíblia considera pecaminoso. Paulo lembra que nem tudo que é socialmente aceitável é espiritualmente benéfico.

  • Sexualidade e identidade: A cultura atual defende que “o corpo é meu, e eu faço o que quiser”, mas 1Coríntios 6:18-19 afirma que o corpo do crente é “templo do Espírito Santo”. O cristão não pode aderir a modismos que contradizem a santidade.
  • Entretenimento e influências: Séries, músicas e redes sociais frequentemente promovem valores antibíblicos. A pergunta paulina “Convém?” deve ser aplicada aqui: “Isso edifica minha fé ou corrompe minha mente?” (Filipenses 4:8).
  • Engajamento crítico: Em vez de simplesmente absorver a cultura, o cristão deve discerni-la (1João 4:1), rejeitando o que é mal e redimindo o que é bom.

3. Viver com autodomínio – A falta de autocontrole é uma epidemia na era digital, onde vícios comportamentais (como dependência de redes sociais, jogos, pornografia e até workaholismo) são comuns. Paulo insiste: “Não deixarei que nada me domine”.

  • Tecnologia e vícios digitais: O uso excessivo de smartphones ativa os mesmos mecanismos cerebrais que o vício em drogas. O cristão deve estabelecer limites para que a tecnologia seja ferramenta, não ídolo.
  • Alimentação e saúde: A gula e o sedentarismo são pecados negligenciados, mas o corpo é sagrado (1 Coríntios 6:19-20). Cuidar da saúde física é um ato de adoração (Romanos 12:1).
  • Disciplina espiritual: O fruto do Espírito inclui “domínio próprio” (Gálatas 5:22-23). Práticas como jejum, oração e meditação na Palavra fortalecem a resistência contra paixões desordenadas.

Portanto, em um mundo que diz “se não é proibido, pode”, 1Coríntios 6:12 nos convida a um padrão mais elevado: “Se não convém ao Reino de Deus, não deve dominar-me”. Aplicar esse princípio exige consciência crítica e coragem contracultural. Além disso, Paulo nos ensina que a liberdade cristã não é um fim em si mesma, mas um meio para santificação. O critério não é a permissividade, mas a pergunta: “Isso me aproxima de Cristo ou me escraviza?”. O desafio é constante, mas, com discernimento dado pelo Espírito Santo, podemos exercer nossa liberdade com responsabilidade e amor, refletindo a glória de Deus no mundo.

Lembre-se: Rendam graças ao SENHOR, pois Ele é bom; o seu amor dura para sempre.

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Christós kyrios